2º Domingo do Advento | Ano A | 07/12/2025
Texto Bíblico: Mateus 3,1–12
Recordemos que Mateus, ao escrever sobre Jesus, o apresenta como o novo Moisés, aquele que não apenas anuncia um caminho, mas inaugura um modo novo de viver. Nesse contexto, a palavra de João Batista “convertei-vos” assume um significado muito mais profundo do que uma simples mudança de comportamentos.
O evangelista utiliza o verbo grego metanoeîte para falar de conversão, cuja formação ilumina seu verdadeiro alcance:
- meta = mudança, deslocamento, para além, transformação;
- noûs / nous = mente, pensamento, consciência, modo de perceber a realidade.
Metanoeîte (Convertei-vos), portanto, significa: “mudai a mente”, “transformai a consciência”, “modificai o modo de ver e interpretar a vida.”
Não se trata de um ajuste moral, mas de uma revolução interior. Não é apenas corrigir atitudes externas, mas reconfigurar a forma de pensar, sentir e decidir.
A verdadeira conversão (metanoia) não é moralismo; é uma mudança que nasce dentro, alcança a raiz das escolhas e se expressa, naturalmente, em novos frutos.
João Batista não pediu perfeição. Pediu lucidez: “Pensem de outra forma, vivam de outra forma, porque Deus está próximo.”
Metanoia = mudar a mente + mudar a direção.
É uma renovação que começa na consciência e desemboca na vida concreta.
O risco da terceirização espiritual
É sempre mais fácil reduzir a conversão ao campo das exigências morais do que assumir a própria responsabilidade sobre aquilo que se escolhe viver. Quando a conversão é entendida apenas a partir da vivência de normas, listas, proibições e pecados, cria-se uma espécie de “zona de conforto espiritual”, onde: eu obedeço regras e, obedecendo-as, sinto-me em paz.
Mas essa paz é superficial, pois não nasce da liberdade, e sim do medo. A moralidade externa exige muito menos do que a responsabilidade interna.
Cumprir normas é simples. Responder pela própria história, não.
Olhar para as escolhas feitas, confrontar a sombra, discernir intenções, reconhecer omissões e assumir o protagonismo da própria vida — isso, sim, exige maturidade espiritual, psicológica e humana.
A conversão verdadeira não é obediência cega a mandamentos, mas integração do coração: é reconhecer que minha vida está nas minhas mãos e que Deus me chama a um protagonismo humilde, real e responsável.
Regras não me expõem. Responsabilidade, sim.
Por isso, é mais confortável falar de normas do que falar da própria verdade da vida.
A moralidade pode se tornar um refúgio para quem tem medo da liberdade. A conversão evangélica, ao contrário, é um chamado à liberdade madura, capaz de afirmar:
A conversão da consciência, não da aparência
João Batista torna-se, assim, surpreendentemente atual. Quando convoca à metanoia (conversão = mudar a mente), ele não pede uma adequação moralista, mas uma mudança profunda de mentalidade, um deslocamento interior capaz de reorganizar a existência.
A conversão que Jesus deseja não é:
- a conversão da aparência, mas da consciência;
- a conversão do medo, mas da escolha;
- a conversão dos discursos, mas da responsabilidade.
Talvez por isso seja tão exigente, pois implica:
- abandonar justificativas;
- abandonar máscaras;
- abandonar a tendência de se esconder atrás de normas ou dos próprios erros e passar a responder honestamente pelo que a vida se torna através das suas decisões.
Converter-se é reconhecer que não sou espectador, mas autor; que minha história, iluminada pela graça, é obra que Deus deseja transformar — mas que precisa do meu consentimento.
Metanoia e psicologia: o encontro com a sombra
Me permito ousar um pouco e trazer a dimensão psíquica para essa reflexão. Apesar de conversão soar como um termo religioso, ela é, em si mesma, parte de um processo que, na psicologia analítica, é conhecido como individuação — aqui, uma individuação espiritual.
Inspirado em C. G. Jung, recordo:
Metanoia (conversão da mente) é esse movimento: encarar o que não queremos ver, integrar o que evitamos sentir, iluminar as zonas internas que insistimos em manter nas penumbras. Só assim a graça encontra espaço para agir.
Concluindo, e recordando o evangelho do primeiro domingo do Advento: a conversão anunciada por João e realizada por Jesus não é fuga do mundo, mas luz para o mundo. Não é abandono da vida cotidiana, mas consciência desperta no cotidiano. Não é medo do fim, mas preparação amorosa para o encontro com Deus.
A metanoia cristã é um convite a viver com os olhos abertos, o coração amadurecido e a vida entregue ao caminho que Deus ilumina.
Que tipo de conversão você realmente busca: a das aparências ou a que transforma sua forma de viver?

Autor: Pe. Adriano da Levedove
Padre, psicólogo, pedagogo e estudioso da psicologia analítica junguiana.
Contato: alevedove@gmail.com